Preso em Sete Lagoas, Valério volta a ser sondado para delação premiada

Foto: Reprodução

No dia 8 de agosto, o publicitário Marcos Valério deixou a Apac (Associação de Proteção e Assistência ao Condenado), em Sete Lagoas (MG), onde cumpre pena de mais de 37 anos de prisão, para prestar depoimento ao Ministério Público de Minas Gerais.

Valério assinou, em julho, um acordo de colaboração premiada com a Polícia Federal. Ele detalha informações sobre o mensalão petista, revelado em 2002, e sobre o mensalão tucano, de 1998.

A proposta havia sido negada pelo MP. Há um ano, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, chegou a enviar dois representantes a BH para ouvir o publicitário, que implicou políticos com foro privilegiado.

O acordo, contudo, não prosperou nem na esfera federal nem na estadual. Em março deste ano, a Promotoria informou não ter interesse nas informações de Valério. Isso agora mudou.

Na visita ao MP estadual, Valério foi ouvido pelo promotor Leonardo Barbabela como testemunha em um inquérito civil.

Segundo ele, Barbabela disse haver interesse na colaboração sobre investigações em curso na Promotoria.

 

As apurações dizem respeito a pagamento de propina a ex-presidentes da Assembleia de Minas.

Valério não topou colaborar com o promotor e disse já ter acertado com a PF. O MP de Minas confirma o encontro, mas nega conversa sobre delação.

“Houve até uma certa estranheza de nossa parte, porque naquele momento já era público e notório o acordo firmado com a Polícia Federal”, disse à Folha o advogado de Valério, Fáber Campos.

A resposta da PF veio em dez dias. Em 18 de agosto, Valério foi chamado para depor sobre “tentativas de frustrar sua delação”, nas palavras de Marcílio Zocrato, delegado responsável.

A delação do publicitário, que ainda precisa ser homologada pelo STF, está no centro da disputa entre PF e Procuradoria-Geral da República pela prerrogativa de celebrar esse tipo de acordo.

PASSARINHO

Ainda segundo o delegado da PF, nomes mencionados pelo publicitário se movimentavam para que a delação não se tornasse efetiva, inclusive cooptando testemunhas.

Em seu depoimento na delação, o publicitário afirma que o acordo não foi para a frente no MP e na PGR devido a um acerto entre PT e PSDB, que teriam influência para barrar o procedimento.

O delator, no entanto, não apresenta provas disso. Diz apenas que o contato com o MP foi feito pelo deputado estadual Durval Ângelo (PT), líder do governo Fernando Pimentel (PT).

Valério conversou com o deputado sobre delatar o mensalão tucano. Ele diz que o contexto, na época, era a discussão na Assembleia para autorizar ou arquivar uma denúncia contra Pimentel.

O publicitário diz, porém, que quando decidiu ampliar o escopo e delatar todos os partidos, o acordo desandou.

À Folha de São Paulo Durval disse que Valério o procurou e que se reuniram duas vezes na penitenciária. “Era um momento difícil para Pimentel e, nos recados que me enviava, Valério dizia que ia acabar com os tucanos em Minas e o governador teria paz. Vi pastas e os termos sigilosos da delação”, afirmou.

“Valério falou que 80% das denúncias eram contra os tucanos, mas que tinha 20% contra o PT, e eu falei que não me importava.”

Eles também trataram de uma transferência para uma Apac . O deputado é membro da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia e é envolvido com essas instituições.

Valério e Durval contam, em uma das poucas partes em que suas narrativas coincidem, que o deputado chegou a avisar Janot sobre a possibilidade da delação em um evento do Atlético Mineiro em julho de 2016. “Ah, o passarinho quer falar”, respondeu o ex-procurador.

O deputado, contudo, não conseguiu a mudança para a Apac, que só veio por intermédio da PF. “Fui informado que não havia interesse na delação, pois os crimes estavam prescritos. A Promotoria sempre foi independente. Não sei de acordo [político].”

Procurado pela Folha, o MP de Minas diz que um eventual acordo ficaria a cargo da PGR, que não respondeu à reportagem.

Campos diz que a suspeita de interferência política vem de “observações até certo ponto óbvias”, já que “no meio do caminho, o interesse do MP desapareceu repentinamente”.

“Houve mudanças inclusive no quadro de promotores que tratariam do caso.” O advogado refere-se ao promotor Eduardo Nepomuceno, favorável à delação e que foi transferido para outro setor em dezembro.

 

MUDANÇA

Na delação, Valério narra ter sofrido retaliação na penitenciária Nelson Hungria, em Contagem (MG), onde cumpria pena antes da Apac.

Segundo ele, os anexos da delação, escritos à mão, eram lidos durante frequentes revistas em sua cela e um agente carcerário apertou-lhe as algemas até quebrar sua mão.

Valério escreveu uma carta e enviou ao STF sobre o ocorrido. Um inquérito policial investiga a agressão.

Campos, seu advogado, diz que Valério “está pagando a conta em uma medida desajustada em relação aos demais envolvidos” e buscou a delação porque “não dava mais pra segurar”.

A defesa afirma que a delação traz fatos recentes e que a Constituição permite que a PF celebre o acordo. “Não corre o risco de não ser homologada baseado em prescrição dos crimes, mesmo porque, a partir da homologação é que os crimes serão investigados.”

Campos já defendia Valério em processos civis e agora passa a conduzir a interlocução com a PF no lugar do advogado Jean Kobayashi Júnior.

“A família do colaborador necessita diuturnamente do advogado, não na acepção da palavra, mas na condição de um interlocutor, que esteja plenamente articulado com a família, que tenha um mínimo de tempo voltado também para outras questões que envolvem a família do colaborador”, disse.

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