No trágico acidente aéreo que sofreu a Associação Chapecoense de Futebol, na madrugada desta terça-feira (29), entre os 75 mortos está o treinador de goleiros Anderson Martins, natural de Pirapora. Boião, como era chamado pelos colegas em Chapecó, viveu toda a infância e adolescência no Norte de Minas, onde deixou o pai, tios, primos e colegas de futebol amador. A família de Anderson soube do acidente através da televisão.
Há pelo menos três anos, o treinador de goleiros programava voltar à cidade natal, e pretendia levar esposa e filhos, que moravam com ele em Santa Catarina. Anderson não pode fazer as visitas que gostaria, mas deixou saudades entre os entes queridos.
“A notícia foi um choque. Ele era um menino muito bom, batalhador. Ele fazia planos de visitar o pessoal daqui agora, no fim do ano, mas infelizmente não deu tempo. É muito difícil de aceitar”, lamenta Lourival Martins, tio de Anderson.
No Norte de Minas, o apelido do até então goleiro era Fábio Júnior. Cresceu jogando nos campos de várzea de Pirapora, sobretudo no antigo “Campo de Cereso”, que deu lugar a um supermercado no Bairro Santos Dumont. O tio de Anderson conta que ele sempre quis ser goleiro.
“Desde muito novo ele queria mesmo ser goleiro. Nunca ocupou outra posição nos campos. Ele saiu daqui para tentar esse sonho, e quando viu que não ia dar certo, encontrou a chance de virar treinador de goleiros. Ele estava realizado, ficando famoso entre os clubes grandes por causa dos resultados que vinha conseguindo com os goleiros que preparava. Eu disse para o pai dele ‘Anderson está de parabéns’”, lembra Lourival, que também já foi treinador de futebol.
A relação de Boião com a defesa dos times começou muito cedo. O time de futebol de Pirapora, no auge da adolescência do esportista, começava a dar passos acertados e se destacar em Minas Gerais. Em uma das competições, a equipe ganhou um campeonato amador e foi vista por clubes maiores. A partir de então, Anderson, com 16 anos, foi defender outros gols.
“Anderson jogava com a gente aqui na cidade e sempre era diferencial no time. Fazias grandes defesas, tinha vontade de pegar a bola. Começamos a ganhar alguns jogos e, quando vencemos o campeonato amador, o time do Democrata de Sete Lagoas o chamou para jogar. Aí ele foi embora, foi atrás do sonho dele”, conta Luiz Pereira, amigo de infância de Anderson e dirigente do Pirapora Futebol Clube.
Várias traves emolduraram a trajetória de Anderson depois da passagem por Sete Lagoas. Jogou em times no Distrito Federal, inclusive no Brasília, depois foi goleiro no Paraná. Viu a oportunidade de virar treinador de goleiros no Chapecoense e, no auge da carreira, teve o sonho interrompido.
“Nós sempre nos falávamos, quase todas as noites pelas redes sociais. Anderson contava que o Danilo, goleiro da Chapecoense, estava se destacando, e que as pessoas estavam reconhecendo o trabalho dele. Estava sendo cotado pelos grandes clubes e pretendia crescer cada vez mais ao lado dos jogadores. Eles foram acreditando na vitória, mas não puderam voltar para as famílias”, diz Luiz.
Anderson trocou com o amigo de infância camisas de time, e, ao receber o uniforme do Pirapora, prometeu a visita. “Ele disse que ia postar uma foto com a camisa do Pirapora assim que chegasse de viagem, e que estava vindo para ficar um tempo com o pessoal daqui. Queria uma matéria com ele aqui, porque ele sonhou e conseguiu vencer”, diz o técnico do Pirapora.
Em Chapecó desde 2008, Anderson virou Boião no sul do Brasil. O apelido era uma brincadeira entre os colegas de clube. Ao procurar pelo almoço pronto, o treinador de goleiros perguntou sobre a “boia”, gíria usada pelos norte-mineiros quando se referem ao prato feito.
O amigo Luiz Pereira não usa camisa de time, mas, nesta terça, a camisa do Chapecoense foi escolhida pelo treinador. “Nunca visto materiais de times, mas hoje é com o Chapecó que vou ficar o dia todo. A imagem que vai ficar do Anderson são os jogos nos campinhos de terra, as brincadeiras, quando chamava ele de ‘barca furada’. É duro de aceitar uma perda dessas”, comenta.
O acidente
O voo que transportava a equipe da Chapecoense partiu na noite de segunda-feira de Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia, em direção a Medellín. Segundo a imprensa local, a aeronave perdeu contato com a torre de controle às 22h15 (local, 1h15 de Brasília), entre as cidades de La Ceja e Abejorral, e caiu ao se aproximar do Aeroporto José Maria Córdova, em Rionegro, perto de Medellín.
O Comitê de Operação de Emergência (COE) e a gerência do aeroporto informaram que a aeronave se declarou em emergência por falha técnica às 22h (local) entre as cidades de Ceja e La Unión.
O diretor da Aeronáutica Civil, Alfredo Bocanegra, explicou à Rádio Nacional da Colômbia que, embora chovesse e houvesse neblina na região, o aeroporto Rionegro estava operando normalmente. Segundo ele, aparentemente foram falhas elétricas que causaram o acidente. O piloto relatou problemas à torre de controle do aeroporto de Santa Cruz, na Bolívia.
Mais cedo, a imprensa colombiana chegou a cogitar como causa a falta de combustível, mas também informou que o piloto despejou combustível após perceber que o avião iria cair.