A Câmara dos Deputados do Chile aprovou nesta quarta-feira (27), em decisão unânime (150 votos a favor), uma lei que reduz em 50% o salário e outras remunerações dos parlamentares.
A medida é provisória e vale por 60 dias enquanto uma comissão autônoma define novos tetos para altos funcionários e políticos eleitos. Estão excluídos da medida prefeitos e membros do Judiciário e do Ministério Público.
A comissão que vai discutir as remunerações deve incluir servidores que já trabalharam no Banco Central e na Controladoria Geral da República.
No fim da sessão, o deputado Gabriel Boric, um dos apoiadores da iniciativa, disse ao jornal La Tercera que espera que a redução de 50% “seja o piso” da comissão para fixar os novos valores.
O deputado Jorge Alessandri criticou o fato de o Judiciário ter ficado de fora do ajuste. “Acreditávamos que o sinal de apertar o cinto era importante.” Ele disse ainda esperar que a comissão reconsidere essa decisão.
A medida é uma resposta aos protestos que tomam o Chile há seis semanas. Em uma escalada na tensão social, saques em um hotel e em vários supermercados, além de incêndios em diferentes partes do país, foram registrados na madrugada desta quarta.
Após a noite de atos, o presidente conservador Sebastián Piñera convocou reunião de emergência com diversos ministros na sede do governo, um dia após pedir que o Exército volte às ruas para defender a infraestrutura do país.
Segundo o ministro da Defesa, Alberto Espina, os protestos -que começaram em reação ao aumento da tarifa do metrô há mais de um mês e passaram a abarcar pautas mais amplas, como a reforma constitucional- estão “alcançando níveis de violência que não eram vistos desde o retorno à democracia”, em 1990.
A cidade turística de La Serena, que fica na costa norte do país, registrou um dos episódios mais violentos: o tradicional hotel Costa Real, em que trabalham 60 funcionários, foi saqueado e em seguida queimado por homens encapuzados. Eles reviraram mesas, danificaram a pintura das paredes e quebraram janelas
Na portuária San Antonio, na região de Valparaíso, a fúria foi repetida com atos de vandalismo que incluíram o ateamento de fogo às instalações do jornal local El Líder.
Ao sul, em Concepción, uma manifestação terminou com incidentes violentos entre homens encapuzados e a polícia.
Já em Santiago, a estação de metrô República -localizada em um distrito universitário no centro– sofreu novamente danos que obrigaram as autoridades a suspender sua operação, acrescentando um novo problema à rede ferroviária metropolitana, que teve mais de 70 estações danificadas desde o início dos protestos, em 18 de outubro.
Em várias partes do país, os panelaços voltaram com força na noite de terça-feira (26), depois da confirmação de que o estudante universitário Gustavo Gatica, 21, ficou totalmente cego devido às balas disparadas por oficiais há algumas semanas.
Mais de 200 pessoas sofreram danos graves nos olhos durante as manifestações. Após a reunião no Palácio de la Moneda, Piñera advertiu que “a violência está causando danos que podem se tornar irreparáveis para o corpo e a alma da nossa sociedade”.
Para o chefe do Senado, Jaime Quintana, de centro-esquerda, o presidente deveria assumir a responsabilidade pela violência. “O governo está longe de ter feito tudo o que poderia e deveria ter feito.”
Na manhã desta quarta, o movimento “No+Tag” -que exige uma queda nos preços das tarifas rodoviárias– retomou as principais vias de acesso de Santiago, causando engarrafamentos.
À tarde, um shopping no bairro também foi palco de protestos pacíficos, e diversas estações de metrô no distrito financeiro foram fechadas em função das manifestações.
Até agora, houve 26 mortos e mais de 2.800 feridos em decorrência dos protestos. Nesta quarta, o peso chileno atingiu desvalorização recorde.
Piñera também desistiu de participar da conferência do clima COP 25, que será realizada de 2 a 13 de dezembro, em Madri, na Espanha. A informação foi confirmada pela ministra do Meio Ambiente, Carolina Schmidt, em um café da manhã com sua par espanhola, Teresa Ribera, informou o jornal La Tercera.
O Chile sediaria a conferência, mas desistiu logo após o começo dos protestos.
Até agora, os esforços de Piñera para conter a violência foram em vão, apesar das promessas de aumentar as pensões, o salário mínimo e os benefícios de saúde, além de convocar um plebiscito para consultar se os chilenos querem uma nova Constituição.