Pesquisa aponta que tremores em Sete Lagoas podem estar relacionados a extração de água

Foto: ilustrativa

O descontrole da extração das águas subterrâneas de Sete Lagoas pode ser uma das causas dos seguidos tremores de terra que vêm assustando a população da cidade distante 70 quilômetros de Belo Horizonte. A explicação está em uma tese de doutorado da Universidade de São Paulo (USP).

Apresentada em 2015 e intitulada “Modelo hidrogeológico conceitual de Sete Lagoas e implicações associadas ao desenvolvimento urbano em regiões cársticas”,, ela investigou fenômenos sismológicos no município mineiro a partir da circulação da água em seu terreno.

Uma região cárstica, como a de Sete Lagoas, se caracteriza pela dissolução química (corrosão) das rochas, que leva ao aparecimento de uma série de características físicas, como cavernas, dolinas, vales secos, rios subterrâneos e paredões rochosos expostos.

No caso de Sete Lagoas, que tem a Gruta Rei do Mato como um dos seus principais atrativos turísticos, essas características são facilmente encontradas ao redor da Serra de Santa Helena e em sua área rural, onde há atividades mineradoras.

Os tremores de terra na cidade não são novidade, o que motivou o estudo do Instituto de Geociência da USP. Também são muitas as ocorrências de crateras abertas involuntariamente em meio a ruas, avenidas e até nos quintais de casas e que há anos atormentam os moradores do município de 240 mil habitantes.

O Centro de Sismologia da USP confirmou a ocorrência de três tremores de terra em pouco mais de 24 horas, na segunda (30) e terça-feira (31), em Sete Lagoas. Fenômeno que tem ficado cada vez mais frequentes no município desde o fim de abril, levando a prefeitura a criar um grupo de trabalho para apurar a causa.

Estudo já pronto fornece um mapa de risco geotécnico de Sete Lagoas

A pesquisa realizada por Paulo Henrique Ferreira Galvão e defendida por ele em 2015, foi clara quanto a relação da extração de água no subsolo de Sete Lagoas com os tremores sentidos em anos anteriores.

“Outros resultados obtidos também estabeleceram que as extrações de águas subterrâneas estão associadas aos eventos geotécnicos cársticos  localizados na área urbana do município”, escreveu o pesquisador na síntese da sua tese.

“A elevada extração das águas subterrâneas faz com que o plano de acamamento carstificado mais raso, em algumas áreas, esteja inteiramente na zona não saturada, provocando os eventos geotécnicos”, completou.

O estudo ainda fornece um mapa de risco geotécnico que identifica, a partir da litologia e do nível de água subterrânea, cinco níveis, e que pode orientar outros pesquisadores, como os que a prefeitura de Sete Lagoas procura agora.

“Este tipo de mapeamento deveria orientar as extrações e os cuidados na ocupação do terreno urbano em Sete Lagoas, prevenindo ou retardando a ocorrência de novas subsidências ou colapsos”, observa Galvão .

A pesquisa dele integrou estudos geológicos, hidrogeológicos, geoquímicos e de isótopos estáveis em Sete Lagoas justamente para entender a circulação da água em terreno cárstico e propor alternativas para seu melhor uso e evitar problemas.

Ou seja, Paulo Henrique Ferreira Galvão já fez o que o poder público municipal deseja realizar por meio de um grupo de trabalho que reunirá diversos especialistas e ainda não tem data para começar, muito menos concluir algo.

Pesquisa destaca abundância de água, mas riscos com sua extração

Paulo Galvão explicou que a área que ele estudou “é constituída por calcários neoproterozoicos da Formação Sete Lagoas, onde se desenvolveram condutos cársticos, dando origem ao aquífero homônimo, o qual está coberto por sedimentos cenozoicos inconsolidados e, ocasionalmente, por rochas metasedimentares neoproterozoicas da Formação Serra de Santa Helena”.

Ele observou que neste aquífero “a porosidade primária é muito baixa e a secundária (micro-fraturas) é igualmente reduzida, devido ao preenchimento por calcita”.

O grande volume de água subterrânea, escreveu o pesquisador, “migra através da porosidade terciária caracterizada dominantemente por dois planos de acamamentos carstificados e, em menor grau, por fraturas sub-verticais carstificadas”.

“A recarga, relacionada às chuvas que ocorrem no período de outubro a dezembro, se dá através de sumidouros, entradas de cavernas e onde o calcário está sob os sedimentos cenozóicos”, observou o cientista.

SAAE mantém mais de 100 poços artesianos em Sete Lagoas

Além das extrações clandestinas, feitas por meio de cisternas cavadas nos fundos de residências, empresas e indústrias, a empresa municipal que fornecia água legalmente aos moradores de Sete Lagoas, o SAAE, chegou a ter 150 poços artesianos.

Este, por décadas, foi o único meio de captação de água no município. Prática que, pelo estudo da USP, pode ter contribuído e muito para os abalos sentidos pela população ao longo de anos e atualmente.

O SAAE mantém 105 poços artesianos ativos, mas, nos últimos anos, Sete Lagoas passou a equilibrar este processo com o sistema Rio das Velhas, que abastece 40% da cidade.

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