Plantão virtual de delegados em MG cria filas de mais de 24 horas na porta das delegacias de Sete Lagoas e outras cidades

Em Sete Lagoas (MG), viaturas ficam na porta de delegacia durante espera
REPRODUÇÃO / RECORD TV MINAS

Advogados e associações que representam policiais militares e civis de Minas Gerais denunciam a formação de filas de mais de 24 horas em frente a delegacias, durante os fins de semana e madrugadas, após a implantação do plantão digital.

O projeto do governo, que vem sendo estabelecido desde 2021, retirou os delegados e escrivães das delegacias de plantão. Eles passaram a trabalhar remotamente em duas unidades de Belo Horizonte e em uma de Montes Claros, a 433 km da capital mineira.

Em Sete Lagoas, cidade localizada a 70 km de BH, o modelo começou a ser usado em janeiro deste ano e tem causado problemas. No último fim de semana, um cliente do advogado criminalista Roberto Campos Avelar precisou esperar mais de um dia para ter o auto de prisão lavrado pelo delegado.

“Estamos vivendo o verdadeiro caos. Ocorrências que eram resolvidas, em média, em quatro ou cinco horas, hoje em dia levam até 12 horas, 20 horas, um dia, e não raras vezes até dois dias para serem recebidas aqui na delegacia”, contou.

Wemerson Oliveira, presidente do Sindpol (Sindicato dos Servidores da Polícia Civil no Estado de Minas Gerais) avalia que a falta de servidores pode ser a causa dos problemas. O agente lembra que os delegados e escrivães do plantão digital precisam atender, via chamada de vídeo, a ocorrências de todo o estado. Enquanto isso, investigadores ficam nas delegacias, com a equipe reduzida, para realizar os atendimentos físicos e o monitoramento dos detidos.

Apenas em 2023, o Sindpol recebeu ao menos 50 denúncias de policiais civis de todo o estado, que relatam problemas com o modelo virtual de atendimento.

“Temos casos de denúncia de investigadora mulher sozinha no plantão, grávida, tendo que transportar presos no plantão digital. Também há relatos de plantão em que tem-se apenas dois investigadores. Além de ele ter que sair para atender as demandas de entrega de presos nos presídios, ele ainda tem que atender a portaria da delegacia e retirar os presos da cela.”

O sargento Marco Antônio Bahia, vice-presidente da Aspra-MG (Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares de Minas Gerais), afirma que o problema se repete em várias regiões do estado, embora já ocorresse em algum grau devido à falta de delegacias em todas as cidades. Para a associação, a lentidão no atendimento prejudica a logística dos PMs que trabalham no interior e compromete a segurança dos municípios.

“Quando um policial militar está, por exemplo, na região de Ipatinga, ele atende a várias comarcas. Tudo vai desaguar em Ipatinga. Então, o polícial militar que está trabalhando em cidade próxima daquela cidade, ela fica desguarnecida de um policial militar, que deve fazer o combate à violência mas tem que ficar em Ipatinga por 24 horas ou mais, aguardando o delegado receber essa ocorrência”, detalha.

Os representantes do Sindpol e da Aspra-MG dizem que têm buscado negociação com o governo estadual sobre o projeto. Uma audiência para discutir o tema iria acontecer em dezembro de 2022, mas a reunião foi cancelada. Um novo encontro ainda não foi remarcado.

Apesar de ainda não haver nenhuma denúncia formal na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em Sete Lagoas, o presidente da unidade, Adriano Cotta, já se reuniu com o chefe da Policia Civil da região em busca de uma solução. Ele fez sugestões à corporação e aguarda um retorno.

“A gente entende que é necessária a criação de uma sala para que esses presos possam ser transferidos para atendimento deles. A partir do momento em que o cliente é deixado em alguma sala reservada, o advogado sabe que ele foi atendido e pode voltar para o escritório e continuar com os afazeres. E, aí, o sistema o iria acionar para o depoimento do cliente. Outro ponto é colocar uma tela demonstrando a ordem cronológica dos atendimentos, para o advogado ter ciência e saber quando o cliente seria atendido”, sugeriu.

Outro lado

Em nota, a Polícia Civil de Minas Gerais declarou que o projeto está em fase de implementação em Sete Lagoas e que foi identificada “a necessidade de ajustes pontuais no funcionamento do Plantão Digital”. “Sendo assim, escalou uma equipe suplementar de policiais civis na Regional de Sete Lagoas, reforçando o número de servidores no atendimento ao público do plantão. Ademais, foi instalada uma sala de espera, para garantir maior conforto aos envolvidos que aguardam o atendimento.”

A organização explica que o projeto é “uma iniciativa estratégica institucional”, em que se busca “uma maior agilidade no atendimento e conforto para os envolvidos, uma vez que se evitam deslocamentos desnecessários de vítimas, testemunhas e policiais”.

O que é o plantão digital

No novo modelo de plantão da Polícia Civil de Minas Gerais, após às 18h e aos fins de semana e feriados, os delegados e escrivães atendem virtualmente às ocorrências, pela sede da cidade administrativa. Há servidores dedicados a cada região de segurança.

“Por meio de videoconferência e outros recursos tecnológicos, são realizadas as oitivas dos envolvidos e os despachos necessários nos sistemas informatizados, com acesso pelas delegacias que darão continuidade às investigações”, detalha o governo.

Nas delegacias, ficam os investigadores, para “recebimento do material apreendido e o encaminhamento da pessoa autuada ou que se encontrava na situação de foragida da Justiça ao sistema prisional”.

Em todo o estado, 71 delegacias já adotam o modelo. Apenas seis ainda não o implantaram. A expectativa do governo é concluir a implementação do projeto até dezembro de 2023.

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